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Minhas férias no interior do mundo e algumas coisas que eu queria te dizer sobre o disco novo do And


Aos 45 do segundo tempo das minhas férias de verão, no pit stop em Vitorinha pós passagem pela Bahia, dei a sorte – ela que andou me faltando – de pegar um show do André Prando no LiverPub, casa dos queridos amigos Bia e Renato, que fazem tanto pela noite capixaba, e que fizeram falta nessa noite inclusive.

Àquela altura, depois ficar doente e sem água em casa a poucos dias da viagem, de sediar o natal na casa da minha mãe e fazer as pazes com alguns importantes membros da minha família, de tirar fotos profissionais que simbolizaram tanto pra mim, de acampar pela primeira vez e passar todos os perrengues envolvidos nessa empreitada, de dar um passo bonito e importante no meu relacionamento atual e de bater o carro da minha mãe na volta da Bahia, eu só queria uma última noite dançando e bebendo com as minhas migas pra voltar pro Rio de alma realmente lavada e animada pra atacar 2019 com a suavidade que o momento pede.

Esses acontecimentos todos estavam nadando aqui no mar que é a cabecinha do ser humano pisciano quando o André começou a tocar, e aí explodiram todos em technicolor quando o show chegou na minha atual música favorita, “Moro no interior do mundo”. Digo atual música favorita porque da primeira vez que ouvi o disco eu gostei mais de “Ave Machinaria”, e esse é o sinal máximo de eu estou apaixonada por um disco – começo a pular de música favorita em música favorita.

Às vezes o processo é longo. São anos venerando uma mesma música, depois outra, depois anos com o disco esquecido num canto da gaveta ou da nuvem, até que ele reaparece e eu me apaixono por uma que nem me chamava tanto a atenção. Foi assim que “Not the doctor” (I don't want to be a bandage if the wound is not mine, reflitam) veio a ser a minha atual favorita do Jagged Little Pill, depois de “Ironic”, “Perfect” e “Forgiven”, nessa ordem. Estou nesse processo com o Noite de Climão da Letrux também, que no contexto todo de como veio a acontecer me lembra muito o Voador, e nem é só porque os dois foram feitos via crowdfunding. É que geral já curtia Letícia, assim como muita gente já conhecia e curtia o André. Mas aí vem aquele disco que muda tudo; que parece que estava ali esperando pra acontecer há tanto tempo, e que acontece bem na hora que devia acontecer, do jeito que deveria acontecer, com os colaboradores que deviam estar ali. E pronto. Um mix de sorte e muito desejo.

Outra coisa que me passou pela cabeça durante o show, e que ando dizendo por aí, é que a melhor/pior coisa que pode acontecer ao André agora é ser descoberto pelos fãs de Los Hermanos. Porque essa galera tá com saudade de fazer catarse ao vivo – Letrux e Baiana são prova – e André ao vivo é assim um lance, só testemunhando. Apesar de ser também um show mais pra dentro, pelo menos pra piscianos. As letras mexem tanto comigo, e vão desorganizando e organizando tanta coisa, que quando eu me dei conta já estava há umas três músicas de olho meio fechado, escrevendo este texto na cabeça.

Mas foco em “Moro no interior do mundo", porque tantas coisas. Pra princípio de conversa, eu nasci em São Paulo na avenida paulista e 90% dos meus colegas and seguidores menos atentos acham que é lá que eu moro. Devo ter cara de São Paulo mesmo. Mas não sou. Sou capixaba de coração e criação e chamo Vitória de Vitorinha ou de terrinha não porque ela seja pequena - não é. Não é nem interior, diga-se de passagem. É capital do meu país Espírito Santo, terra da verdadeira moqueca, de Rubem Braga, de Elisa Lucinda, do bonde da Quase, do Hortifruti gourmetizado e até do Roberto Carlos. Minha Vitorinha. No diminutivo apenas porque o som nasalado do “inha” denota carinho em pt-br, bem disse Lenine.

Pra quem sai, esse retorno de fim de ano à cidade natal é sempre uma onda. E sempre uma onda diferente. Este ano por exemplo eu cheguei analisada, calma e disposta a resolver todas as pinimbas e perrengues no amor. Cozinhei, recebi, apaziguei, expliquei e amei. Foi suave até quando não foi. Mas o que me impressionou mesmo, e a música do André representa tão bem, é o quanto os interiores tendem a permanecer sempre os mesmos, e a se parecer entre si. Há tradições a cumprir, memórias pra rememorar, histórias pra contar de novo.

Na Bahia, ouvindo histórias tristes e lindas da Vera, dona do camping onde me hospedei, cuja família por acaso é de outro interior do Espírito Santo, Colatina, percebi que a gente se cheira e se reconhece, nós que somos do interior. Muitas das minhas grandes amigas atualmente cariocas também vieram de algum “inho” por aí, e se junta todo mundo em volta de uma mesa na casa de alguém (porque quem é do interior tem isso de ir na casa das pessoas), com vinho e uns petiscos, nós viramos todas tias velhas contando causos da juventude e rindo e chorando até o sol nascer.

Talvez essas amigas do Rio sintam a mesma mistura de sentimentos que eu sinto quando percebo as minhas amigas do interior fazendo novos amigos e adquirindo vidas novas - porque não é só alegria e definitivamente não é ciúmes, esse sentimento que a gente devia parar de nomear até que ninguém mais soubesse o que significa e assim esquecêssemos todos de uma vez. É um mix de felicidade e melancolia, salpicado daquele gostinho de “e se?” E se eu tivesse ficado? E se eu fosse juíza? Onde eu moraria aqui? Com quem eu namoraria aqui? Como seria a minha casa se fosse aqui no interior do mundo?

Até que você se dá conta de que os amigos das suas amigas podem também ser seus, e que nessa equação tudo se ganha e nada, absolutamente nada, se perde. Talvez só um pouco de sotaque.

Ou, como bem diz minha mãe, um gambá cheira o outro, amigos; e quem é livre se reconhece.

No mais, fiquem com a nossa belíssima bandeira, que atende bem a meninos and meninas, que é trans de berço e que me lembra sempre, onde quer que eu esteja, que o pôr do sol mais bonito do mundo inteiro pra mim sempre será o de Guarapari.

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