No uber (!) a caminho da Lapa conversávamos eu e a Dri sobre as nossas lembranças do Circo Voador (!!), e sobre o quanto os shows ali têm uma atmosfera diferente. Estávamos fazendo um ranking dos melhores shows no Circo, mas discordávamos. Como eu sou parcial vou contar só o meu.
Teve aquele primeiro Franz Ferdinand no comecinho de 2006; centenas de pessoas de lado de fora oferecendo pra lá de 300 reais pra entrar, um calor desumano. Foi ali que eu entendi o que era estar na primeira fila de um show de rock (pra nunca mais, risos). Ficar inteira ensopada, da meia ao sutiã, passando pela calcinha. Lembro do Alex parando o show e pedindo pra produção trazer água pro gargarejo, e lembro que essa foi a primeira vez em que eu ouvi aquele medley maravilhoso de “This Fire” com “Outsiders”, que depois virou tradição nos shows da banda. Teve também o show 500 do Los Hermanos, mais ou menos na mesma época, com participação especial do Ney Matogrosso – coisa linda ver a banda no auge. E o meu top 3 se encerra com o Warpaint, que foi quando eu aprendi que se o Queremos traz uma banda que você não conhece, você compra o ingresso e vai mesmo assim, porque as chances de ser foda são altíssimas. Fui sem conhecer uma música e hoje ouço pra caralho.
Mas vamos voltar aqui pro assunto. Enquanto cruzávamos a cidade também reparamos na nossa pontualidade. Saímos de casa às 21h cravadas, sem pressa, jantadas e arrumadas, e já tínhamos um plano para a chegada no Circo. Comprar uma cerveja, sentar deboas ali debaixo das palmeiras, fumar um cigarro e, por fim, se posicionar ali na pista. Quase um “Método adulto de assistimento de show”. Depois eu percebi que eu realmente tenho um método, desenvolvido depois que eu parei de ter disposição para aguentar o gargarejo. Ou seja, depois daquele único show do Franz. Tenho um espírito meio idoso mesmo.
Por sorte ou por alinhamento astrológico, meu método encaixou perfeitamente com o show de ontem. Faço assim: chego cedo e escolho um dos cantos do palco – direito ou esquerdo. Não precisa ser primeira fila, mas razoavelmente perto. Fico ali de papo enquanto a casa enche. O esforço do adulto pontual é recompensado sempre, e a multidão que vai se aglomerando atrás te empurra ainda mais pra perto do palco. Ontem acabamos na terceira fileira. Daí começa mo show. Gente, Brittany. Brittany de capa. Que mulher. Fiquei triste que ela já chegou arrancando a capa, mas enfim, calor né. Como é quase impossível chegar no tom dela, reparei que o público estava mais quietinho, e quem sabia as letras apenas as murmurava, meio que em respeito, pra não estragar aquela demonstração incrível e surreal de poder vocal. Achei bonito da nossa parte. Meu objetivo era permanecer ali até que rolasse “Hold on”, pra depois seguir para a segunda etapa do método.
Foi um pouco sofrido, porque demorou. Mas penso assim: se eu vou ter que sair pra fazer xixi no meio do show, que eu troque de perspectiva. Quando finalmente terminamos de cantar, dessa vez sim em coro e em alto e bom som “You got to come on up / you gotta hold on”, saí pela tangente (por isso é importante escolher um canto), fiz meu abençoado xixi, comprei outra cerveja e fui me embrenhar na arquibancada. Pra isso o Circo é incrível, porque mesmo que pareça lotada, a arquibancada é vasta e em níveis, então se você fizer uma forcinha logo chega ali no meio, onde sempre há lugares vazios de sobra pra assistir ao show com uma visão panorâmica. Eu amo esse contraste – de estar vendo o suor na cara da vocalista, toda apertada, suada e embalada pela galera, pra logo depois estar lá em cima, testemunhando a ferveção do público, tomando um vento e prestando atenção nos outros componentes do palco.
Foi de lá que eu reparei que as pessoas estavam realmente transfixadas com os vocais da Brittany, e que mesmo sem querer ela ofuscava um pouco o resto da banda. Até os backing vocals, que são totalmente maravilhosos, não interagiam muito com ela ou com o público. Ficaram ali dançando e sendo fofos, mas só. Claro que ninguém é obrigado, e que a frontwoman é ela mesmo, mas enfim. Fiquei esperando o momento em que eles iriam lá pra frente fazer dancinhas com a Brit.
Foi lá de cima que eu ouvi os outros dois hits da banda, “Be mine” e “Don't wanna fight”, e foi lá também que, num momento mais emotivo, que comecei a pensar que muita gente ali estava assistindo ao show pela segunda vez, e que essas pessoas certamente estariam refletindo sobre como estavam suas vidas antes e como estavam naquele momento. Eu tenho essa coisa com memórias. Pensei em como estava minha vida três anos antes e cheguei à conclusão de que muita gente poderia estar chorando relacionamentos perdidos, ou comemorando reviravoltas incríveis. Torci quietinha para que tivesse mais gente no segundo grupo. Rever bandas que a gente ama tem dessas, né – o show marca muito um momento da nossa vida. E aí as músicas ganham novos significados, as companhias mudam – ou não. É sempre um acerto de contas, definitivamente.
Sobre a polêmica (?) dos celulares, vou dizer que nem vi tantos assim. Vi alguns. Confesso que eu mesma tirei uma meia dúzia de fotos. Ué, não adianta espernear e bancar o evoluído – alguns momentos são dignos dessa tentativa um pouco torta de captura. O show de ontem teve vários desses.